tempo teimoso

sexta-feira, 21 de março de 2008

Bia


É Bia. É ela. Nome de mulher. Fêmea que já foi. Quem sabe se volta a ser.

Bia. Cedo de mais desposou. Cedo de mais amou. Cedo de se mais s´entregou. Toda. Por inteiro. De si nada sobrou.

Bia alegre e giraça. Fazia parar a praça e despertava desejo. Com o tempo, os ombros cairam, o brilho fugiu e a solidão chegou. Bia no tempo parou.

Bia é gaja rija. Que amamenta. Que acalenta. Que trabalha. Que cozinha. Que labuta. Bia é gaja de luta.

Sonha à noite, no frio de cama nua. Sonha com afago, com elogio inventado, com piropo, com desvario, com flor roubada, com colar de guita, com vestido de chita e roda de dança. No sonho, roda, ri, rodopia. Acorda e suspira. É tudo mentira. Não passa de esperança.

Bia. Mulher. Mal amada.

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quinta-feira, 13 de março de 2008

Pai ...

Eram duas e meia da manhã. O telefone de casa tocou. A estas horas da madrugada os telefones só tocam por má nova. Do outro lado a mãe chorava, falava rápido, atropelando palavras, pedindo urgência na ida. A mãe nunca pede nada, muito menos de madrugada. A mãe nunca fala rápido, ainda por cima quando devia estar a dormir. A mãe nem é de chorar...

Enganou-me. Ou não. Não me disse que estavas morto mas não me deu qualquer esperança de vida. Acho nem ela ainda tinha certezas. Contou-me do filme que tinham visto noite dentro, duma brincadeira de almofadas pra lá e pra cá e duma má disposição que não esperou pelo famoso chá de louro da avó Naicinha.

Foram os trezentos quilómetros mais longos de sempre. Estava frio, muito frio. Os miúdos enroscados uns nos outros, soluçando entre mantas.

A mãe ia ligando, de quando em quando, pedindo ordem na condução e calma e coragem e aqueles cuidados todos que ela sempre tem, mesmo quando a hora é de desespero.
Parecia um filme que não era nosso. Faltavam lá as tuas graças e as tuas lágrimas. Sempre as tiveste faceis. As graças e as lágrimas.

Entre tantas coisas, deixaste-nos a tua forma carinhosa de amar. Não é que seja relevante, mas também herdamos uma boa dose da tua teimosia...

Foi há um ano. A mãe chega hoje. Vem passar o dia connosco.

quarta-feira, 12 de março de 2008

Viver

Viver é ter capacidade de amar, de bem acolher, de ouvir e também de aceitar colo e abraços e beijos em tempo de amargura. Viver é rir e chorar. Às vezes é um piscar de olho. Uma cotovelada manhosa. Um grito na vitória. O desânimo na derrota.

Viver é adormecer e acordar de novo, de volta à luta.

Viver é todos os dias. Aqui e ali. Lá e cá. Juntos. Disponíveis. De braços abertos para receber. De mãos estendidas para dar. Os olhos bem acesos. As mentes bem despertas. Sonhando com os pés postos no chão. Sem ocultar erros, injustiças, maldade.

O mundo não é cor-de-rosa. Viver é vê-lo de todas as cores!